maio 1, 2011
Veja mais fotos no fim da página
Saiu no dia 28/4/2011, matéria intitulada “Com maconha liberada, praça Sete vira Amsterdã mineira”, veja aqui. A noticia já começa equivocada, afinal, em Amsterdã ninguém fuma maconha na rua e sim em Coffee Shops destinados a isso. Mas como toda matéria sensacionalista, precisa de um título de impacto, na sequência se apresentam algumas fotos de pessoas enrolando e fumando cannabis sativa na praça Sete, centro de Belo Horizonte. As fotos mostram um grupo de jovens da periferia e um suposto artesão consumindo a erva.Com o claro intuito de criminalizar o grupo dos artesãos nômades, a matéria noticia “um grupo de hippies prepara os cigarros de maconha”, deste modo ela generaliza a ação de indivíduos a um grupo histórica e socialmente marginalizados pela sociedade. Como todos sabemos, o uso da cannabis sativa já não se configura em crime desde 2006, então não bastava esse fato para que a matéria alcançasse seu objetivo, eis que surge uma testemunha que não se identifica e diz “Fumam maconha, pedem esmola de forma agressiva e, às vezes, praticam pequenos furtos e defecam nas calçadas”, conta um pedestre.”
Uma acusação claramente fabricada para legitimar o teor de criminalização que a matéria tenta passar, afinal não existe nenhum caso de furto cometido na praça Sete por artesãos nômades, nem tampouco nenhuma autuação referente a fazer cocô na praça. Importante lembrar que em nenhum momento a reportagem procurou ouvir os artesãos e publicar sua versão dos fatos.
A matéria segue, desta vez provocando a Policia Militar, a acusa de ser conivente e apática com relação à situação:
“Em nenhum momento, enquanto os flagrantes eram feitos, os usuários foram abordados por policiais”
“A maioria dos comerciantes disse já ter acionado a Polícia Militar para resolver o problema“
“A sensação de insegurança é tanta que nenhum dos entrevistados quis se identificar”
“Gostaria que a polícia acabasse com isso aqui” Depoimento de um suposto comerciante.
“O que os frequentadores da praça Sete vêem todos os dias, a polícia parece não conseguir flagrar”
A pressão parece ter dado certo antes mesmo da matéria ter sido publicada, pois na segunda feira, dia 25/4/2011 a polícia começou a praticar batidas na Praça Sete, em conjunto com a fiscalização do município, batidas estas que acontecem sistematicamente há pelo menos 7 anos e denunciadas por mim há pelo menos 2 anos. As batidas policiais especificamente voltadas para os artesãos e a apreensão dos trabalhos artesanais pela gerência de fiscalização seguiram acontecendo nos dias 26, 27, e 28 . Além de trabalhos artesanais, a gerência de fiscalização, respaldada pela polícia militar, apreendeu também matérias-primas para a fabricação dos artesanatos, tais como fios de arame, rolos de linhas, sementes e pedras, além de confiscar as ferramentas tais como alicates e martelos, e como se não bastasse isso, também foram levados cobertores e até mesmo as mochilas dos artesãos. Até o fim da noite postarei os videos com as cenas que provam.
Mas a grande repressão veio no dia 29/4/2011, sexta feira, um dia após a publicação da matéria. Com um contingente de 40 policiais militares e 30 fiscais da prefeitura, acompanhados de três canais de televisão e todos os grandes jornais de belo horizonte, deu-se início a uma batida policial no local. A prefeitura alardeou em seu site a “mega operação” e fez questão de qualificar os artesãos como “toreros ou camelos”, desqualificando a profissão de artistas e o conteúdo ideológico deste grupo.
Em todos estes dias (do dia 25/4 ao dia 29/4), ao longo de no mínimo 6 operações no local, apenas um servente de pedreiro foi preso portando cannabis sativa, só pra constar.
Antes de apresentar as denúncias de irregularidades e abuso de poder que se seguiram nesta ação conjunta de poder público, policia militar e mídia, vamos retornar à matéria do jornal O Tempo e conhecer um pouco sobre Magali Simone, jornalista que assina a matéria.
Em seu perfil no linkedin.com, veja aqui , a jornalista descreve sua longa atuação na imprensa, trabalhou 6 anos como office-boy na Visão Total S.A. (de 1995 a 2001), e após um hiato de 8 anos(2001 até março de 2010) trabalhou na assessoria de imprensa, como free-lancer para a Serjus/Anoreg-MG, atividade que se inicia em março de 2010 e se encerra em outubro de 2010. Contratada há apenas 4 meses pelo Jornal O Tempo, já é a segunda vez que Magali Simone se envolve em uma matéria sensacionalista, criminalizando grupos sociais marginalizados pela sociedade e que curiosamente, em ambos os casos servem aos interesse da Prefeitura de Belo Horizonte, temas que inclusive foram reproduzidos no site da prefeitura veja aqui e aqui.
Em 13 de março de 2011, Magali Simone assinou a matéria “GOLPE – Sem-teto negociam lotes em acampamento por até R$ 12 mil” ,veja aqui, a matéria segue a fórmula aplicada na abordagem feita aos artesãos da praça Sete, uma denúncia isolada, que generaliza e estende a ação de um indivíduo à 887 famílias que fazem parte da ocupação Dandara, mais uma vez, o Jornal O Tempo não ouve os moradores do local, mais uma vez a matéria cita acusações de furto sem mencionar boletins de ocorrência e baseados na denúncia de uma pessoa que não se identifica. A matéria gerou repúdio generalizado, onde várias instituições e pessoas se pronunciaram contra a matéria do jornal, uma rápida busca no google sobre as tags “magali simone dandara” pode mostrar as reações da população.
Voltando à operação realizada na praça Sete, no dia 29/04/2011, a tríade polícia, prefeitura e mídia, chegou por volta de 11:30 da manhã. Havia 15 artesãos no local e além deles, foram fiscalizados outros dois populares que estavam na praça. Os artesãos foram encostados na parede e foram todos revistados minuciosamente, nenhuma droga foi encontrada com eles. Enquanto estavam encostados na parede, sob coação da polícia militar, os fiscais iniciaram seus trabalhos e começaram a confiscar os bens dos artesãos. Rasgaram e destruíram os trabalhos dos artesãos (veja no video, postarei até o fim da noite), além de levarem ferramentas(alicates e outros), levaram também matérias-primas para a confecção de sua arte, tais como fios de arame e linhas, além de sementes e pedras. Os restos dos materiais destruídos eram colocados dentro de sacos plásticos e lacrados, porém dos 15 artesãos fiscalizados e que tiveram materiais apreendidos, apenas um recebeu o auto de infração e apenas porque a mídia o entrevistou. Os outros foram ignorados em um direito garantido por constituição: Artigo 5, paragrafo VIII – “Ninguém será privado de seus bens sem o devido processo legal”.
O Artesão Genivaldo, que já havia perdido seus trabalhos por duas vezes na mesma semana(na terça, 26/4 e na quinta 28/4), se indignou ao ver sendo recolhidas suas ferramentas e matéria-prima, tentou intervir e um policial o impediu ameaçando prendê-lo. Ele ficou revoltado e começou a dizer que o estavam roubando era, não só os seus bens particulares, mas sua própria dignidade. Foi dada a ele voz de prisão por desacato. Um popular que assistia a tudo e nada tinha a ver com a historia, se manifestou contra a operação e o gerente de Regulação Urbana da Regional Centro-Sul, William Nogueira praticamente deu voz de prisão ao popular, solicitando a presença de um militar para proceder, o indivíduo foi preso, como se fazia nos tempos da ditadura. Ao todo foram 3 pessoas presas, um servente de pedreiro que portava pequena quantidade de maconha para consumo próprio, um popular que se indignou com o que viu e um artesão que não ficou calado ao ver ser apreendido suas ferramentas e matéria-prima. Veja o video(esperem, ainda em fase de edição).
Que fique claro, a infração dos artesãos alegada pela prefeitura é o comercio de produtos sem autorização em via pública, porém ser artesão não é crime, logo não existe justificativa legal que ampare a apreensão das ferramentas, matérias-primas e outros bens pessoais como mochilas e cobertores.
Ao fim da operação, os artesãos ficaram indignados e começaram um protesto pacífico na praça Sete, onde passaram a pedir esmolas aos populares, explicando que a prefeitura lhes havia roubado suas ferramentas de trabalho. Os artistas estão realizando um abaixo assinado junto à população e dizem que se tornarão mendigos, mas que não irão embora do local. A defensoria pública designou uma advogada para acompanhar os artesãos no caso.
Na minha visão, como testemunha dos fatos que ali ocorreram, eu denuncio as seguintes irregularidades:
- A fiscalização ultrapassou suas prerrogativas ao confiscar bens pessoais como ferramentas e matérias-primas, além de mochilas e cobertores.
- Não foram lavrados os autos de infração e entregues aos artesãos. Contrariando o Artigo 5 da constituição federal brasileira, parágrafo VIII – “Ninguém será privado de seus bens sem o devido processo legal”. Acompanhei ainda dois artesãos que ao solicitar o auto foram informados de que deveriam buscá-los na 6a. companhia da policia militar, e ao chegarem lá o próprio gerente de Regulação Urbana da Regional Centro-Sul, William Nogueira, na presença do Major Adriano (responsável pela região central de BH), lhes disse que realmente não havia lavrado os autos e que se quisessem teriam de ir à sede da gerência de fiscalizações.
- Um popular foi preso por manifestar sua contrariedade à ação, ele o fez de forma pacifica, sem desferir palavrões ou mesmo aumentar o tom de voz, veja no video.
- Um artesão ao ver um direito seu violado, manifestou-se contra e foi preso.
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